Conversamos com o vice-presidente sênior de Assuntos regulatórios americanos e jogo responsável da Entain para discutir as novas regulamentações de jogos do Brasil, dar conselhos para os operadores e falar sobre a importância da integridade no mercado emergente da América Latina.
Há uma grande disparidade nas regulamentações globais de jogos de apostas, em termos de escopo e severidade. Como você compara o cenário regulatório europeu com o de mercados emergentes como a América Latina?
A Europa, correndo o risco de dizer o óbvio, está muito à frente da América Latina em termos de regulamentação de jogos de apostas. No entanto, apesar de alguns desafios, o Brasil está finalmente no caminho da regulamentação de apostas esportivas em um futuro próximo.
A Colômbia é um ótimo exemplo de um regime regulatório bem-sucedido na América Latina, que se inspirou muito na regulamentação de jogos da Espanha. Acredito que isso se deve em parte às semelhanças do idioma e da cultura. Também vale notar que, embora as jurisdições individuais sejam diferentes e sigam tipos diversos de esportes e mercados, estamos falando de apostas esportivas, portanto, a mecânica básica do produto será sempre a mesma para refletir os requisitos da regulamentação.
Quais outros países da América Latina estão atualmente em processo de regulamentação do setor?
A maioria dos países latino-americanos já regulamentou o setor terrestre de uma forma ou de outra, portanto, na verdade, falta apenas regulamentar o espaço online. Algumas províncias argentinas regulamentaram o jogo online e, assim como o Canadá, parecem estar fazendo isso uma província por vez. O Peru e o Chile também estão estudando a possibilidade de regulamentar os jogos de apostas online; tenho esperança de que isso aconteça em um futuro próximo, mas como ambos enfrentam uma crise política, é pouco provável que isso aconteça tão cedo.
Embora o Peru tenha aprovado uma legislação que permitiria a regulamentação do setor de jogos de apostas online no ano passado, os tumultos recentes paralisaram novamente qualquer avanço. No Chile, o Presidente Gabriel Boric afirmou que está interessado em reformular a constituição chilena, mas esse processo falhou e, como resultado, ele está juntando os cacos e ponderando sobre os próximos passos.
A regulamentação do Brasil está próxima. Quando é provável que a regulamentação de jogos no país seja aprovada?
A regulamentação vai para o Congresso como projeto legislativo, com urgência constitucional. Isso significa que o Congresso precisará debater e votar nos próximos três a seis meses. Portanto, se o projeto for aprovado, é provável que o mercado regulamentado seja lançado no início de 2024. Como o projeto de lei é bem abrangente, ele permite que as autoridades iniciem o processo de licenciamento. Haverá um número ilimitado de licenças, um sistema de licenciamento aberto, que prevê medidas fiscais adicionais. É provável que a regulamentação abranja o processo de instituição de licenciamento, o processamento de pagamentos e a exigência de que os provedores de serviços de internet bloqueiem a conexão à internet dos operadores que optarem por não se regulamentarem.
Qual é o seu conselho para os operadores com sede no Brasil ou voltados para o mercado brasileiro? Como eles devem se preparar para a nova regulamentação?
Não é uma surpresa para ninguém. A regulamentação das apostas esportivas brasileiras é debatida desde 2018, quando o governo foi autorizado pelo Congresso a regulamentá-las. Meu conselho para os operadores é que fiquem atentos aos procedimentos e comecem a se preparar. No entanto, com a ausência das iterações finais das regulamentações, ainda é aconselhável ter cautela até que elas sejam aprovadas.
É muito provável que a regulamentação exija que os operadores constituam uma entidade no Brasil. Eu acredito que não haverá uma obrigação de basear as instalações reais no país, pois isso poderia acabar com o setor, mas os operadores devem estar preparados para fornecer às autoridades brasileiras acesso aos dados dos clientes brasileiros, de uma forma ou de outra. Isso pode ser remoto ou por meio de um servidor de dados no país. Em relação à verificação de clientes, acredito que estará vinculada ao número de identificação CPF (número fiscal atribuído pela Receita Federal do Brasil a brasileiros e estrangeiros que pagam impostos no Brasil). Também é provável que haja um foco na integridade esportiva e no jogo responsável, não apenas por causa dos escândalos recentes de manipulação de resultados que prejudicaram o futebol brasileiro.
O governo e o regulador analisaram as regulamentações existentes em outros países, portanto, também é provável que se inspirem nelas.
O termo “jogo responsável” é mencionado diversas vezes no informativo sobre jogos de apostas do governo do Reino Unido, e é provável que ele também apareça bastante nas regulamentações brasileiras. Na sua opinião, o significa jogo responsável? Como você interpreta esse termo?
O jogo responsável é fundamental para a sustentabilidade a longo prazo desse setor. Tenho trabalhado pessoalmente em estreita colaboração com o regulador em normas de jogo responsável e pretendo continuar fazendo isso. Quando o mercado brasileiro for finalmente regulamentado, isso fornecerá aos operadores e às autoridades ferramentas para enfrentar de forma mais eficiente os tipos de escândalos de manipulação de resultados que temos visto recentemente.
A responsabilidade recai sobre nós, como setor, de proteger nossos clientes e, é claro, de ajudar nossos clientes a se ajudarem. Isso ainda não recebe a devida atenção. Se os clientes não conseguem fazer isso, precisamos avançar ainda mais nesse quesito. Quanto mais atendimento individual pudermos oferecer aos jogadores problemáticos, melhor. Porque o que é útil para uma pessoa pode não ser útil para outra. Assim como relacionado a clientes ou promoções: o que talvez não seja do seu interesse, pode ser do interesse de outra pessoa e vice-versa. Isso ressalta a necessidade de individualizar e personalizar o atendimento. É isso que eu quero ver nos próximos anos em toda a América Latina.
Em um sentido tangível, como seriam esses tipos de medidas?
Na minha opinião, é uma combinação de três pilares críticos.
Educação. Precisamos encontrar formas ainda mais eficientes de educar todos os envolvidos, o que vai muito além dos nossos clientes. Isso abrange o público em geral, incluindo os principais tomadores de decisão, e é por isso que a Entain lançou programas aqui nos Estados Unidos (e em outros países), com ligas como a NFL, a MLS e, mais recentemente, com ex-membros da NHL. Também trabalhei com atletas aposentados, como Charles Oakley e Jayson Williams, para servirem como embaixadores do jogo responsável e transmitir mensagens ainda mais eficazes sobre o jogo responsável.
Prevenção. Precisamos fornecer aos nossos clientes ferramentas para se ajudarem e, se não puderem mais fazer isso, precisamos intervir e assumir o controle da plataforma de jogo – nós os chamamos de interceptadores. Ou mesmo apenas ligando para os clientes.
O terceiro pilar é colocar os clientes em um caminho firme em direção à cura; um caminho de tratamento firme. Mais uma vez, a responsabilidade recai sobre nós, o setor.
Em relação ao setor de jogos canadense, você acredita que é apenas uma questão de tempo até que outras províncias sigam Ontário e abram o mercado para operadores privados?
Sim, é uma resposta curta: espero que Alberta siga o exemplo muito em breve, e depois a Colúmbia Britânica, mas não vou especular quanto ao prazo. Acho que se outras províncias decidirem seguir o caminho de Ontário, seria a decisão mais sensata.
Por que você acha que alguns países, por exemplo o Canadá e a Argentina, preferem a abordagem de uma província por vez para a implementação de regulamentações nacionais?
É uma questão constitucional e herdada em ambos os casos. No Canadá, por exemplo, em 1985 ou 1986, o governo federal delegou competências para regular todas as formas de jogos de apostas, e não apenas jogos online, a províncias individuais. Esse é o cenário, assim como nos EUA. Nova Jersey, onde moro, conquistou recentemente uma vitória muito árdua para regulamentar as apostas esportivas e os jogos online, e o mesmo acontece no Canadá.
Se tiver interesse em mais insights de especialistas do setor e líderes inovadores, confira uma de nossas entrevistas da série Fintech Spotlight Interview abaixo.
- Roger Redfearn-Tyrzyk, diretor de jogos e vendas globais da IDnow (entrevista em inglês)
- Viky Manaila, diretora de serviços fiduciários do Grupo Intesi (entrevista em inglês)
- Brandi Reynolds, CAMS-Audit, CCI e CCCE do Bates Group (entrevista em inglês)
- Jinisha Bhatt, investigadora de crimes financeiros (entrevista em inglês)
- David Birch, consultor global e investidor em serviços financeiros digitais (entrevista em inglês)
Você é um operador de jogos de apostas e tem interesse em entrar no mercado emergente do Brasil? Confira nosso blog “Desvendando as complexidades da estrutura de licenças de jogos de apostas brasileira”. Alternativamente, confira nossa página de visão geral sobre o Mercado de jogos de apostas online da América do Sul ou as Regulamentações do mercado de jogos de apostas na internet em Ontário, no Canadá.
By
Jody Houton
Senior Content Manager at IDnow
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